A instabilidade econômica e a inflação galopante vivida pelos brasileiros até o Plano Real, em 1994, impediram que governo e setor privado pudessem pensar o planejamento do País e das empresas no médio e no longo prazos. Quase 20 anos depois, com a economia estabilizada e a inflação sob controle, não mais se justifica a ausência de políticas públicas com vista a esse futuro.
O rápido crescimento das últimas duas décadas transformou a escala dos problemas do País, que se acumularam e se multiplicaram. Tendo a dívida externa deixado de ser problema, surge forte a dívida social. A educação e a saúde têm tido seus recursos mal planejados e mal utilizados. A ausência, por mais de 20 anos, de investimentos em obras de infraestrutura tem feito surgir os gargalos que hoje existem nas cidades, nos portos, nos aeroportos e nas estradas.
No governo não há um pensamento estratégico nem um efetivo planejamento que antecipe os problemas do crescimento e equacione as dificuldades nas áreas de energia, meio ambiente, segurança, crescimento urbano, indústria, comércio exterior e mesmo de política externa. À magnitude dos problemas internos que governo e setor privado têm de enfrentar se somam as grandes transformações que ocorrem no mundo (revolução da energia, emergência da China, cadeias produtivas globais) e afetam a economia do País.
A sociedade brasileira está anestesiada. E a classe política não consegue encontrar um caminho que influa de forma positiva na construção de um País moderno. Embora as instituições sejam fortes, o sistema político é disfuncional e fraco, deixando de lado os verdadeiros interesses nacionais. Perdeu-se a noção de que a busca da utopia - como o fim da inflação e a eliminação da pobreza - é um dos motores do desenvolvimento e dos avanços sociais.
Em meio a esta situação de perplexidade, proposta elaborada pela Fiesp de uma estratégia para o crescimento da economia brasileira com um horizonte de 15 anos deveria merecer o exame do governo e do setor privado e ser debatido pelo Congresso e pela sociedade em geral. O propósito do trabalho é contribuir para o desenvolvimento sustentado do País, tendo como premissa a combinação do crescimento econômico com os avanços sociais. Na base das propostas apresentadas está a conjugação de uma série de políticas públicas que assegurem maior competitividade sistêmica, propiciando, em consequência, o fortalecimento de alguns setores mais dinâmicos e com perspectivas de investimentos expressivos. O projeto apresenta definição de metas e de estratégias e não está centrado apenas nos interesses da indústria, mas de toda a sociedade brasileira.
A meta da proposta é dobrar a renda per capita do País em 15 anos. De US$ 10.979 em 2014 para US$ 22 mil em 2029, medidos em paridade do poder de compra, e elevar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) para o patamar de entrada das nações do Primeiro Mundo. Para a consecução desses objetivos será necessário que o PIB avance a uma taxa média de 5,3% ao ano.
Esse é um Projeto de Futuro viável. Seu êxito resultará da capacidade da sociedade brasileira de incrementar o investimento em capital físico, formar em maior escala recursos humanos qualificados e maximizar a produtividade total dos fatores. Os países bem-sucedidos em dobrar o PIB em períodos inferiores a 20 anos (Japão, Coreia do Sul, Malásia e Taiwan), partindo de patamar próximo ao do Brasil atual, definiram um conjunto de ações visando a apoiar a indústria de transformação. Com base nessa experiência histórica, o trabalho analisa as condicionantes macroeconômicas de aporte de capital em projetos produtivos. Os investimentos devem saltar dos atuais 17,7% para uma taxa média de 23,7% do PIB em 15 anos. O investimento público terá fundamental importância e será beneficiado pela redução dos gastos com juros da dívida pública e por um programa de controle da expansão do gasto corrente.
Os setores com potencial para atrair investimento seriam os da construção civil e infraestrutura (rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e hidrovias), do agronegócio (grãos, sucroalcooleiro, proteína animal e fertilizantes), do petróleo e gás e da indústria de transformação (naval, automobilística, química, siderúrgica e de bens de capital) e seus subsetores. O critério empregado foi o potencial de receber investimentos futuros e de gerar renda e demanda para as demais áreas, como os setores de varejo e de serviços, de maneira que estes também cresçam e contribuam para a expansão macroeconômica.
O trabalho apresenta ações para alavancar os investimentos em cada uma dessas áreas com repercussão sobre toda a economia nacional, de maneira a se chegar à meta agregada de aporte de recursos em atividades produtivas, que estabeleceriam um círculo virtuoso de desenvolvimento.
Dentre as recomendações de políticas públicas macroeconômicas e transversais, que afetam diversos setores, cabe ressaltar, na monetária, a desindexação dos preços administrados; no câmbio, uma posição ativa internacionalmente com o objetivo de reduzir os movimentos de valorização artificial; no sistema tributário, isonomia fiscal, eliminação da cumulatividade de impostos, unificação dos tributos sobre a renda, eliminação da acumulação de créditos tributários; incentivo a investimentos diretos pela ampliação de medidas tributárias de estímulo, redução do custo de capital, ampliação da oferta de crédito e melhora das condições de acesso; incentivo à inovação e à pesquisa; aperfeiçoamento das compras governamentais; incentivo à capacitação de pessoas; incentivo à exportação e à integração às cadeias produtivas globais e melhora da competitividade nos insumos críticos, como energia.
A Fiesp lança o debate. Resgatemos a utopia.
* PRESIDENTE DO CONSELHO DE COMÉRCIO EXTERIOR DA FIESP.