Ao aceitar sediar a Jornada Mundial da Juventude, a Copa das Confederações, a Copa do Mundo e a Olimpíada, o Brasil se comprometeu a adotar rígidas medidas no campo da segurança pública. Uma dessas medidas é a modernização da legislação penal.
Como a tramitação dos projetos de lei costuma ser lenta, a modernização da legislação penal deveria ter sido iniciada há muito tempo. Mas, como é rotineiro no País, essa providência não foi tomada em tempo hábil e o Legislativo agora corre para votar esses projetos antes que se iniciem os eventos. Por isso, a comissão mista do Congresso criada para consolidar a legislação penal decidiu dar prioridade ao tema de maior interesse dos organismos multilaterais: a tipificação do crime de terrorismo.
Relator da matéria, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) prometeu entregar seu parecer nesta semana. Ele propõe que a pena máxima aplicada a quem for condenado por crime de terrorismo seja de 30 anos - limite imposto pela Constituição. Em seu parecer, Teixeira não concede ao terrorista o regime de progressão da pena, regulado pela Lei de Execução Penal, que permite ao preso com bom comportamento passar do regime fechado para o semiaberto. Mas assegura a liberdade ao terrorista arrependido que colaborar com as investigações. "Como estímulo à colaboração em favor da sociedade, temos de isentar de pena o integrante de quadrilha que se arrepender, confessar e impedir que o crime ocorra, denunciando-o às autoridades", diz Teixeira.
A maior dificuldade enfrentada pelo relator está, justamente, na definição do crime de terrorismo. Teixeira adotou a mesma tipificação prevista pelo projeto do novo Código Penal, que está em tramitação no Senado.
Segundo esse projeto, terrorista é quem "causa terror na população" mediante várias condutas ilícitas - como sequestrar ou manter alguém em cárcere privado; usar, transportar, guardar ou portar explosivos, gases tóxicos ou "outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa".
O projeto do novo Código Penal do Senado também classifica como crime de terrorismo incendiar, depredar, saquear ou invadir bens públicos ou propriedades privadas; interferir, e danificar sistemas de informática e bancos de dados; e sabotar o funcionamento ou apoderar-se do controle de bens de comunicação ou transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias e rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia e instalações militares.
Os autores do projeto do novo Código Penal tiveram o cuidado de detalhar as condutas que podem ser classificadas como terroristas, mas a definição é criticada por grupos de esquerda e vários partidos que integram a base aliada do governo no Congresso.
Eles alegam que uma tipificação detalhada do crime de terrorismo abre caminho para a criminalização dos movimentos sociais, permitindo com isso, por exemplo, que os participantes de invasões de propriedades rurais, lideradas pelo Movimento dos Sem-Terra, ou de edifícios urbanos, realizadas pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto Urbanos, possam ser processados como terroristas.
A polêmica não é nova. Em 2002, o então deputado Robson Tuma apresentou um projeto que tipificava o terrorismo como "toda ação, individual ou coletiva, tendente a causar insegurança, pavor ou dano, com a finalidade de coagir alguém a praticar ou deixar de praticar determinados atos, ou, ainda, subverter a ordem política constituída". Doze anos antes, a Lei 8.072 deixava de incluir o terrorismo na lista de crimes hediondos, embora o considerasse crime "insuscetível de anistia, graça, indulto, fiança e liberdade provisória".
Nas últimas décadas, as nações desenvolvidas reformaram a legislação penal, tipificando o crime de terrorismo. Por causa da resistência dos movimentos sociais e dos partidos de esquerda, o Brasil até hoje não conseguiu modernizar seu direito penal.