Wikileaks-Brasil: Honduras-EUA: Itamaraty atordoado...
Diplomacia e Relações Internacionais

Wikileaks-Brasil: Honduras-EUA: Itamaraty atordoado...


O Wikileaks pode ser um desastre para os diplomatas e historiadores, mas é um tesouro de trouvailles para os jornalistas.
Este relato sobre essas "liaisons dangereuses" são sempre saborosas em sua leitura retrospectiva...
Paulo Roberto de Almeida

Chegada de Zelaya a embaixada atordoou Itamaraty, revela WikiLeaks

Tensão. Missão brasileira em Honduras chegou a sofrer ameaça de bomba e ministro de Relações Exteriores insistiu com os EUA para que adotassem medidas mais duras contra o regime de facto, como a interrupção do envio de dinheiro de imigrantes

Denise Chrispim Marin - O Estado de S.Paulo
21 de dezembro de 2010 | 0h 00

Em meio à crise em Honduras, em 2009, a Embaixada do Brasil em Tegucigalpa foi ameaçada de explosão. O alerta por telefone, recebido pela embaixada em Washington, pôs a diplomacia brasileira em cooperação com o Serviço Secreto dos EUA para rastrear a fonte da ameaça. O fato foi registrado em um dos 13 telegramas enviados pela embaixada americana em Brasília ao Departamento de Estado e vazados ontem pelo WikiLeaks.
O conjunto de relatos mostra o governo brasileiro "perdido", "sem planos" e ansioso por ações mais efetivas da Casa Branca. Os telegramas vazados foram redigidos entre 4 de setembro de 2009 e 19 de fevereiro de 2010, período em que as relações entre o Brasil e os EUA foram contaminadas pela crise em Honduras. Destituído por um golpe militar e exilado em junho do ano passado, o então presidente, Manuel Zelaya, retornara a Tegucigalpa e pedira abrigo na embaixada brasileira em 21 de setembro. A autorização partira do então secretário-geral das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, apontado em outros telegramas como um "antiamericano" e "obstrutor" da relação Brasil-EUA.
Com o título "Brasil carece de estratégia em Honduras", o texto de 2 de outubro de 2009 não traz maiores detalhes sobre a ameaça de bomba na embaixada em Tegucigalpa. O diplomata dos EUA mostra ter sido informado sobre o assunto pela Divisão de México e América Central. Também é informado que o Brasil, naquele momento, não havia uma estratégia para lidar com a crise e o Brasil esperava uma posição mais forte do Conselho de Segurança das Nações Unidas. O americano conclui que esse setor do Itamaraty transformara-se em uma "sala de crise". Mas apenas para processar as informações - não para planejar uma solução.
"O Brasil parece perdido sobre o que fazer. É incrível que o governo brasileiro não tenha feito esforços para envolver a região ou para ter um papel mais decisivo na busca de uma solução", diz o telegrama. "Ao contrário, parece que o Brasil está procurando que os EUA, a OEA e a ONU salvaguardem seus interesses e espera uma solução de longo prazo", completou.
Em telegrama de 20 de novembro de 2009, o embaixador Antonio Patriota, secretário-geral das Relações Exteriores - hoje, futuro chanceler -, afirma a um diplomata americano que a situação de Honduras "não era positiva para a relação Brasil-EUA". Mas, sugere que a postergação das eleições presidenciais hondurenhas, poderia favorecer uma solução porque daria tempo para o retorno de Zelaya ao poder. Segundo Patriota, sem essa medida, o Brasil não teria como reconhecer o novo governo do país. A eleição acabou ocorrendo no dia marcado.
Pelo menos dois telegramas mostram que, tanto o chanceler Celso Amorim quanto o assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, insistiram com autoridades americanas para que os EUA adotassem medidas mais duras contra Honduras. Em texto enviado em 25 de setembro de 2009, um diplomata brasileiro esclarece a um colega da embaixada britânica que o Brasil queria dos EUA o corte das remessas de dinheiro de hondurenhos ao país - o que não aconteceu.
Em conversa com o general James Jones, então conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Amorim acusou Washington de fazer concessões e "arranhões superficiais" ao governo de facto em vez de lhe causar danos. Marco Aurélio argumentou a Jones não ser Zelaya um "revolucionário perigoso" e seu retorno à presidência não provocaria "mudanças significantes". Um diplomata brasileiro, entretanto, informou que o Itamaraty estava irritado com a suspeita de que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, estava por trás das ações de Zelaya.



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