A inflação disparada parece haver preocupado, afinal, a presidente Dilma Rousseff e os dirigentes do Banco Central (BC). Não havia mais como olhar para outro lado. Em março a taxa acumulada em 12 meses chegou a 6,59% e estourou o limite de tolerância, de 6,5%. O assunto ganhou destaque nas primeiras páginas dos jornais, nas capas de revistas semanais e nos programas de rádio e TV. A demorada resposta foi dada na quarta-feira, quando o Comitê de Política Monetária (Copom), de maneira quase envergonhada, elevou de 7,25% para 7,5% a taxa básica de juros da economia. O tímido aumento foi acompanhado de uma promessa de "cautela" nos próximos passos.
A timidez transparece também no comunicado emitido pelo Copom. A nota menciona a inflação elevada, a disseminação dos aumentos e a resistência da inflação, fatos bem conhecidos e apontados muitas vezes, desde o ano passado, por analistas do mercado financeiro e de instituições independentes. O documento sugere a possibilidade de novas altas de juros, mas com uma ressalva: "Incertezas internas e, principalmente, externas cercam o cenário prospectivo para a inflação" e recomendam cautela na política monetária.
A ressalva, um tanto cabalística, é menos misteriosa e mais preocupante do que pode parecer à primeira vista. O pessoal do BC continua argumentando como se os grandes problemas internos, como a persistente alta de preços e o fiasco do crescimento, fossem determinados principalmente, ou em grande parte, pelas condições externas. Essa alegação foi usada em agosto de 2011, quando o Copom iniciou a redução dos juros. A recessão internacional, segundo se explicou na época, derrubaria as cotações dos alimentos e de outros produtos básicos e isso ajudaria a frear a inflação no Brasil.
A previsão foi errada, como se verificou em 2012, e o erro decorreu principalmente de um diagnóstico falho. Ao contrário da tese oficial, a inflação brasileira, claramente vinculada a fatores como o gasto público excessivo e a rápida expansão do crédito, é um produto essencialmente nacional, assim como a estagnação do PIB. Basta olhar a evolução de outros países emergentes e em desenvolvimento para ver como é falso o discurso repetido em Brasília. Pode-se crescer muito mais, com inflação bem menor, apesar do ambiente externo desfavorável. Chile, Colômbia, Equador, México, Paraguai e Peru comprovam essa possibilidade.
O erro maior e mais sério, no entanto, resulta de uma espécie de vesguice mental. A presidente Dilma Rousseff insiste em proclamar a redução dos juros como grande realização de seu governo. Se novos aumentos forem necessários, diz a presidente, a taxa ainda será menor do que a vigente em outros tempos.
Há dois equívocos nesse palavrório. De fato, os instrumentos de política monetária tornaram-se mais eficazes, mas isso é consequência da integração financeira. Há dez anos o crédito correspondia a 25% do PIB. Essa relação dobrou. Qualquer medida - alta dos juros ou aperto do crédito, por exemplo - pode produzir mais efeitos do que há alguns anos. É uma tolice atribuir essa mudança ao voluntarismo da presidente da República. Mas instrumentos mais eficazes só funcionam se forem usados, e o BC, obediente à Presidência, demorou muito a agir.
Além disso, a presidente Dilma Rousseff, aplaudida por uma parte do empresariado, agiu sempre como se o grande problema do Brasil, no setor monetário, fosse a persistência de juros mais altos que os de outros países. Essa tese desvia a atenção do problema central. Juros altos podem ser ruins, mas a questão realmente grave é a persistência de uma inflação endêmica e bem maior que a de quase todos os participantes do comércio global. Em outros países, surtos inflacionários são combatidos com rapidez e determinação. No Brasil, a própria meta de inflação, de 4,5%, com margem de tolerância de dois pontos porcentuais, já revela uma perniciosa tolerância inflacionária. Como o governo gasta demais e ainda transforma em farsa o compromisso com a meta fiscal, sobra a política monetária como arma contra a alta de preços. E mesmo essa arma o BC, submisso à desorientação do Palácio do Planalto, deixou de usar por quase dois anos