Entrou em vigor nesta sexta-feira (21/6), com a publicação no Diário Oficial da União, a Lei 12.830/2013, que dá maior autonomia aos delegados de polícia.
A lei estabelece que o delegado só poderá ser afastado da investigação se houver motivo de interesse público ou descumprimento de procedimentos previstos em regulamento da corporação que possam prejudicar a investigação. O ato com essa finalidade dependerá de despacho fundamentado por parte do superior hierárquico. A lei também manda dar tratamento protocolar aos delegados igual ao recebido por magistrados, defensores públicos, membros do Ministério Público e advogados.
A presidente Dilma Rousseff vetou, no entanto, o parágrafo 3º do artigo 2º do projeto aprovado no Congresso (PLC 132/2012), segundo o qual o delegado deveria conduzir a investigação criminal de acordo com seu “livre convencimento técnico-jurídico”.
Nas razões para o veto, a presidente apontou a possibilidade de "conflito com as atribuições investigativas de outras instituições, previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Penal".
A revista eletrônica Consultor Jurídico apurou que, dentro da Advocacia Geral da União, há o entendimento de que o veto dá indícios de que o governo entende que o Ministério Público tem poder para investigar.
A avaliação é semelhante à do criminalista Alberto Zacarias Toron. “A razão do veto é clara como a luz do dia: visa a impedir o conflito com outras autoridades com poder investigativo. O juiz não o tem. Só resta o MP, estadual e federal. Portanto, os signatários do diploma legal, incluído o Ministro da Justiça, entendem que o MP tem poder investigatório”, afirmou.
O criminalista Luís Guilherme Vieira também compartilha desse entendimento. “O teor do texto relativo ao veto presidencial conduz, de jeito oblíquo, ao raciocínio de que o Executivo sustenta poder o MP conduzir/investigar crimes, o que, em meu entender, é flagrantemente inconstitucional.”
Ele avalia que a questão será decidida apenas quando o Supremo Tribunal Federal se pronunciar. “Enquanto o STF não decidir, de uma vez por todas, a questão do ‘MP-investigador’ (a única hipótese constitucional de o MP investigar crime é quando o investigado for integrante de seus quadros), a questão não encontrará termo”.
Para Leonardo Sica, é possível inferir que quem redigiu a norma pretende preservar a possibilidade de outros agentes públicos investigarem crimes. Isso, porém, não indicaria aval à investigação pelo MP. “É um indício desse entendimento, mas esse assunto tem suscitado muitas controvérsias, por isso não me arriscaria a um palpite”.
O criminalista Pierpaolo Botini também considera que não é possível ser taxativo quanto ao entendimento do governo em relação ao poder de investigação do MP. Ainda assim, como a mensagem de veto fala em "atribuições investigativas de outras instituições", isso pode indicar um entendimento de que elas têm sim poder de investigação, com uma ressalva: "Desde que conveniadas com a polícia".
Ele avalia que a polêmica tem sido insuflada por interesses político-institucionais e por desconhecimento da opinião pública sobre o tema. “Não vejo necessidade para tanta polêmica. De maneira delimitada e regulada por lei, acho natural que outros agentes públicos, excepcionalmente, possam se incumbir de investigações criminais”.
Sergio Niemeyer também não vê o veto como insinuação de que o Planalto aprove a competência investigava do MP. Para ele, a decisão de Dilma é inclusive salutar, pois evita um conflito entre o livre convencimento da autoridade policial e a atividade fiscalizatória do MP.
“Tome-se, por exemplo, o caso do ex-delegado federal Protógenes Queiroz. Se esse dispositivo estivesse em vigor, ele jamais seria condenado, porquanto encastelaria sua conduta atrás do biombo do livre convencimento, como, aliás, fazem hoje muitos juízes, sem nenhum compromisso ético com a escorreita aplicação da lei, violando o juramento prestado na forma do artigo 79 da Loman”.
Responsável pela área criminal do Pinheiro Neto, Mario Panseri também considera difícil vislumbrar na mensagem de veto qualquer posição do governo em relação à PEC 37. "A precoupação está num possível mal entendido das palavras livre-convencimento técnico e imparcialidade. Sem isso poderia dar ao delegado a psossibilidade de negar o cumprimento de requisições de outros órgãos principalmente do MP".
Ainda que o parágrafo não tivesse sido vetado, Panseri avalia que ele não faria diferença para o mundo jurídico. "O delegado sempre deve conduzir as investigações de acordo com seu bom senso, livre convencimento, isenção e imparcialidade. Esses são atributos básicos para que a autoridade policial possa conduzir suas investigações". Com informações da Agência Senado.