Retrocede Brasil (4): um Banco Central "bonzinho"
Diplomacia e Relações Internacionais

Retrocede Brasil (4): um Banco Central "bonzinho"


Surpresa: o governo encomendou uma inflação de 10% para você, este ano, caro leitor.
Bem, não é tão surpresa assim.
Desde quando a inflação estava controlada, graças aos esforços do BC, colocando-a abaixo da meta em 2007, o Conselho Monetário Nacional poderia ter recuado as metas de inflação para 2008 e 2009 para patamares mais condizentes com a média internacional, de aproximadamente 3% ao ano (inferior a isso nas economias avançadas e um pouco acima nos países emergentes).
Mas não: a despeito da insistência do presidente do BC, o atual ministro da Fazenda, que já o era naquela época, insistiu em manter a meta de 4,5% por um prazo indefinido (lembro-me, aliás, que ele sempre foi amigo da inflação, achando que uma taxa em torno de 5% era "normal" num país como o Brasil).
Depois, em ano eleitoral, forçaram o BC a manter inalterada a taxa durante dois trimestres seguidos, a despeito da nítida aceleração da atividade econômica, em função do enorme aumento do crédito propiciado pelas políticas do governo em várias áreas, num keynesianismo exacerbado que só se viu por aqui.
Mais recentemente, o BC inventou um tal figura de "medidas macroprudenciais" para não ter de aplicar a velha receita do aumento de juros para combater a inflação.
Deu no que deu: a inflação fugiu ao controle e tudo por culpa do governo: nos últimos anos, a oferta monetária tem se elevado consistentemente muito acima do crescimento do PIB, geralmente o dobro da taxa.
Agora, rompeu-se a confiança dos agentes econômicos, do público em geral, nas políticas do governo.
Aguardem: a inflação vai disparar, e não adianta presidenta (ugh!) e ministros dizerem que não vão tolerar a inflação. Esta sempre vai poder dizer: vocês vão ter de me aguentar!
E nós temos de aguentar ministros incompetentes...
Paulo Roberto de Almeida

Surpresa na Ata do Copom
Editorial - O Estado de S.Paulo
29 de abril de 2011

A inflação sobe, há muita insegurança em relação aos preços, o quadro internacional é incerto e, diante disso, o aumento de juros deverá ser "suficientemente prolongado", segundo a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada nessa quinta-feira pelo Banco Central (BC). A mensagem é tranquilizadora pelo menos quanto a um ponto: a inflação é reconhecida como um problema preocupante e a autoridade monetária está disposta a elevar os juros até o risco ser controlado. Mas permanece uma dúvida. Segundo o Copom, a situação piorou desde sua reunião anterior, no começo do mês passado. Se esse é o caso, por que a taxa básica subiu apenas 0,25 ponto porcentual, metade da elevação aprovada nas sessões de janeiro e de março?

O aumento de 0,25 ponto foi decidido por 5 votos contra 2. Os diretores vencidos propuseram 0,5 ponto de ajuste. Segundo a ata, a maioria dos membros levou em conta as medidas tomadas anteriormente - elevações de juros e restrições ao crédito. Essas medidas, segundo o julgamento predominante, ainda levariam algum tempo para produzir efeitos sensíveis.

O argumento seria muito razoável, em outras circunstâncias. O efeito de medidas monetárias normalmente só aparece depois de transcorrido algum tempo. Mas o cenário examinado pelos membros do Copom antes da votação continha alguns detalhes especialmente inquietantes. Não houve, desde a reunião anterior, apenas continuação de pressões inflacionárias. Houve uma piora sensível das condições de formação dos preços. A insegurança no quadro internacional foi agravada pela instabilidade no Norte da África e no Oriente Médio. As cotações das commodities continuaram instáveis. A contaminação dos demais preços, no mercado interno, prosseguiu. A demanda no mercado brasileiro continuou - e continua - elevada, pondo em xeque a capacidade de oferta. As medidas tomadas até agora, reconheceram os diretores do BC, foram insuficientes para impedir a expansão do crédito, embora possam ter contido sua velocidade. O nível de ocupação da capacidade instalada continua muito alto nas indústrias - um importante sinal de alerta.

Mesmo com sua linguagem arrevesada, a ata é bastante clara quanto aos motivos de preocupação. Todos os cenários prospectivos - montados pelos técnicos do BC ou por economistas do setor privado - continuam muito ruins. Segundo o texto, o Copom reconhece um "nível de incerteza acima do usual" no ambiente econômico. Além disso, identifica "riscos" para a "concretização de um cenário em que a inflação convirja tempestivamente para o valor central da meta". Ou, traduzindo para linguagem corrente: pelos dados atuais, vai ser muito difícil baixar a inflação para a taxa anual de 4,5% até o fim de 2012.

Em relação às contas públicas, a linguagem é um pouco menos diplomática do que tem sido há vários meses. Segundo a ata, os membros do Copom tomam como pressuposto o alcance das metas fiscais fixadas para este e para o próximo ano, sem ajustes (isto é, sem os descontos usados nos últimos anos para melhorar o resultado). As atas têm registrado normalmente esse pressuposto. É uma espécie de política de boa vizinhança entre o BC e o Ministério da Fazenda. Mas desta vez há alguns acréscimos.

A ata menciona, além da expansão do crédito, os "impulsos fiscais aplicados na economia nos últimos trimestres" como uma das causas da demanda elevada. Além disso, acentua a importância, para a contenção dos preços, da efetiva geração dos superávits primários prometidos pelo Executivo. Há um processo de consolidação fiscal, acrescentam os autores da ata, cautelosamente. Mas o dado importante é o lembrete: o controle da inflação depende também da arrumação das contas do governo.

O quadro apresentado é tao preocupante quanto poderia ser qualquer cenário realista montado por um técnico independente. Além disso, os dirigentes do BC reconhecem, segundo o texto, a gravidade do problema. Falta conferir se agirão de acordo com esse reconhecimento, executando uma política de rigor proporcional à gravidade do desafio.



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