Editorial O Estado de S.Paulo
A conclusão de um dos grandes empreendimentos lançados pelos governos petistas, em seus dez anos no poder, vai ser adiada, como tem acontecido rotineiramente com muitos dos projetos incluídos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A Ferrovia Transnordestina, numa extensão de 1.728 km, só deve ficar pronta, se tudo correr bem, em 2015 (ligação com o Porto de Suape, em Pernambuco) e 2016 (ligação ao Porto de Pecém, no Ceará). Quando começaram com estardalhaço, em 2006, a previsão era de que as obras dessa ferrovia seriam concluídas no fim do governo Lula.
O prazo teve de ser prorrogado para 2014. Dada a impossibilidade de que isso venha a ocorrer, o governo acabou tendo de aceitar uma nova dilatação do prazo. E, lógico, o custo também aumentará: o valor orçado de R$ 5,4 bilhões, já revisto para R$ 6,72 bilhões, subirá para R$ 7,5 bilhões só para a construção. Preveem-se gastos adicionais de R$ 1,5 bilhão para aquisição de material rodante (vagões e locomotivas), sem contar investimentos em oficinas e nos portos. O projeto tem sido financiado, em boa parte, pelo Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), Banco do Nordeste e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
No ano passado, quando esteve em Pernambuco, onde percorreu canteiros de obras, a presidente Dilma Rousseff cobrou um andamento mais rápido do projeto, tendo recebido a promessa da Transnordestina Logística (TLSA) de que a ferrovia seria concluída ainda em seu mandato. Não adiantou.
Alegando a necessidade de mais recursos e a demora dos Estados de Pernambuco e do Ceará em fazer as desapropriações pelas quais ficaram responsáveis, a TLSA pediu e conseguiu mais uma prorrogação. Segundo o jornal Valor (22/2), o governo cogitou de fazer nova licitação, inserindo a Transnordestina no bloco das ferrovias que serão privatizadas. Essa hipótese foi descartada por ter o Planalto avaliado que isso poderia desgastar a imagem do governo.
O fato vem comprovar, ainda uma vez, as deficiências de planejamento e gestão de projetos pelo governo, mesmo aqueles, como a Transnordestina, que têm merecido destaque na retórica oficial. A ferrovia, que atravessa sete Estados, deveria contribuir para melhorar a situação de pobreza crônica e subdesenvolvimento no interior do Nordeste, ligando-o a portos modernos como Suape e Pecém. Assim, poderia ser escoada a produção de novas fronteiras agrícolas do Piauí e do Maranhão e haveria condições econômicas para novos investimentos no semiárido, inclusive para exploração das riquezas minerais da região, como ferro e gesso.
Para alcançar esses objetivos, seria indispensável definir prazos para a construção da linha e liberar recursos com base numa análise realista dos custos. Como tem ocorrido com outros projetos - não há melhor exemplo disso do que o projeto de transposição de águas do Rio São Francisco -, a construção da Transnordestina ficou praticamente sujeita ao acaso, sendo conduzida de acordo com o ritmo irregular da liberação de verbas.
No pico das obras, em 2011, o trecho entre Eliseu Martins, no Piauí, e o Porto de Suape, numa extensão de 1.200 km, tinha 9.600 homens trabalhando, número que caiu hoje para 3.754. O único trecho efetivamente construído tem 262 km de extensão e seus trilhos não levam a lugar nenhum. Os trabalhos prosseguem em lentidão exasperante, no dizer de um técnico, e há quem considere que a conclusão das obras dez anos depois de iniciadas é uma previsão até otimista.
Em face desse quadro, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) promete fazer alterações no contrato com a TLSA, adequando os prazos e prevendo penalidades no caso de seu não cumprimento. Se a concessionária voltar a apresentar repetidas falhas no cronograma, como tem ocorrido, o contrato será simplesmente cancelado. Isso presume, naturalmente, que as dotações serão liberadas também tempestivamente, o que não se ajusta aos padrões que a administração federal vem adotando.