Em um continente conturbado e com indicadores sofríveis, o caso peruano desponta. Sua economia deve cravar crescimento de 5,6% este ano, o dobro do desempenho brasileiro, e em 2014 promete ser o melhor Produto Interno Bruto (PIB) da América Latina.
Os bons números nada têm de milagre. São fruto da moeda estável, regras econômicas claras e políticas fornidas longe da fogueira populista que tanto atrai os líderes latinos. Loas para Ollanta Humala, o ex-militar e outrora golpista que, para se eleger presidente, guardou as camisas vermelhas, abriu o punho cerrado e revisou a retórica nacionalista para os tempos mais sóbrios.
Quem olhe o país de longe vê um dínamo nos Andes. De perto, a vista é outra. Humala amarga um dos piores índices de popularidade da América Latina. Os 41% de peruanos que aprovaram seu governo em junho hoje são 27%. Há dois meses, milhares de manifestantes, a maioria da classe média, tomaram as ruas contra Humala.
Como um país pode ir tão bem e seu líder, tão mal?
O paradoxo não é privilégio peruano. O Chile segue líder disparado na região, com crescimento forte, investimento robusto e a melhor cultura de administração do continente. Já seu presidente, Sebastian Piñera, um empresário equilibrado, corre o risco de terminar seu mandato com uma rejeição recorde.
Na Colômbia, não é diferente. Lá, o presidente Juan Manuel Santos preservou a política de segurança e de sobriedade fiscal que elevou o país à condição de segunda economia sul-americana. No entanto, a aprovação de Santos despencou 27 pontos desde junho (está em 21%) e sua reeleição em 2014 já é dúvida.
Enquanto os líderes moderados ardem no inferno astral político, os bolivarianos no Equador, Venezuela e Bolívia e Nicarágua, gozam de índices invejáveis mesmo quando pisoteiam seus dissidentes e tumultuam suas economia.
Venezuela sofre blecautes, uma epidemia de crime e escassez de papel higiênico? Não importa, Hugo Chávez, que governou soberano durante 14 anos, é quase beato enquanto seu inexpressivo sucessor, Nicolás Maduro, tem o dobro de aprovação de seu par colombiano. Nicarágua é um dos países mais pobres da América Central, mas o comandante Daniel Ortega conta com 70% de aprovação dos nicaraguenses.
Pão e circo. A senha para essa aprovação é distribuir pouco para muitos, uma receita garantida por petrodólares e ingressos de minérios, e controlada pelo poder estatal. Encampar empresas privadas, calar a imprensa e intimidar sindicatos, tudo pode desde que haja migalhas. O pão sustenta o circo bolivariano.
No Peru, Humala cometeu erros e deslizes. A violência subiu na zona rural e em alguns bairros de Lima, piorando a sensação de insegurança. (Mesmo que o país ostente uma das menores taxas de homicídio nas Américas: 2,4 por 100 mil habitantes.) Um quarto dos peruanos ainda vive na pobreza.
Seu pior pecado, no entanto, foi quebrar tabus. Para desgosto de muitos ex-companheiros, o mandatário defendeu as reformas de Alberto Fujimori. Não foi afinidade ideológica. Humala sabe que o ex-tirano fechou o Congresso, atropelou direitos humanos, comprou apoio político e acabou na cadeia. Também reconhece que Fujimori abriu a economia, equilibrou as contas e esmagou a guerrilha maoista.
Melhor para os investidores, sim, que apostaram alto em obras vultosas de mineração e infraestrutura. Só que seus ganhos também impulsionaram a economia e criaram empregos. Com dois anos de antecedência, o Peru acaba de alcançar os Objetivos do Milênio das Nações Unidas, reduzindo pela metade o número de pobres em 15 anos.
No Peru, como em outras sociedades em ascensão, quem sobe de vida enxerga melhor e logo, exige mais. Foi assim com os presidentes Alejandro Toledo e Alan Garcia, dois que abraçaram reformas e também saíram às vaias. Agora, a bola da vez é Humala.
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Domingo15/09/2013
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