Diplomacia e Relações Internacionais
Miseria do debate no Brasil atual: O. Tambosi, O. Carvalho
Abaixo, dois artigos, de um dos intelectuais mais atacados no Brasil, Olavo de Carvalho, um atual, outro de quase 15 anos atrás, tratando do mesmo problema fundamental no Brasil que se pretende inteligente (mas que alimenta dúvidas sobre a solidez desse estatuto): neles uma mesma reclamação de Olavo de Carvalho em função da falta de um debate verdadeiro entre correntes filosóficas e políticas opostas, dada a "hegemonia" -- uma palavra que os gramscianos usam no sentido pejorativo, quando se referem ao capital, mas que adoram, quando se trata de sua dominação cultural -- sobre os chamados "aparelhos ideológicos do Estado", como diriam os pobres althusserianos. Eles reclamam que tudo está dominado pelo capital monopolista, pela grande mídia (sempre perversa, sempre golpista, sempre capitalista, claro), quando na verdade são eles que dominam as universidades e os principais veículos de comunicação, impedindo qualquer debate realista e racional: funcionam à base de slogans, invectivas, condenações, mas raramente com base em argumentos ponderados.Agradeço a meu colega e amigo de lutas pela inteligência Orlando Tambosi por me chamar a atenção para esses textos e por introduzir o artigo atual, com palavras tão certeiras.Faça minhas as palavras de ambos, quando à miséria dos "intelequituais" gramscianos, incapazes de sair de sua camisa de força mental para debater abertamente.Paulo Roberto de Almeida
O marxismo brasileiro e a morte da crítica
Orlando Tambosi, 12/03/2013
Agradeço ao filósofo e jornalista Olavo de Carvalho ter lembrado de meu livro sobre a decadência do marxismo, lançado em 1999, e corroboro o que ele diz: ideias que contrariam o marxismo, no Brasil, são sistematicamente ignoradas, dentro ou fora da academia. Nas universidades, em geral, pensar contra a corrente (como dizia Berlin) vale a condenação ao ostracismo, não isento de manifestações de hostilidade. Danke, caro Olavo, ainda que eu não mereça a ilustre companhia de Gilberto Freyre, Paulo Mercadante, José Guilherme Merquior e todo o elenco que você cita.
Surrupio na íntegra o artigo "O plano e o fato", publicado ontem [11/03/2013] no Diário do Comércio, de São Paulo. E, atenção, detratores, podem me chamar de direitista, reacionário, positivista, liberal etc. A defesa das liberdades, no Brasil lulista, constitui um verdadeiro atrator de adjetivos por parte dos esquerdistas, que supõem ter chegado ao fim da história com o falastrão de Garanhuns. Chegaram, na verdade, ao pensamento único, que imputavam ao tal de "neoliberalismo". Resumindo: mataram o pensamento e a crítica. [OT]
O plano e o fato
Olavo de Carvalho
Diário do Comércio, 11/03/2013
O caso do Dicionário Crítico, que lembrei no artigo "Devotos de um vigarista", é somente a figura mais extrema, caricatural e grotesca que o fenômeno assume no Terceiro Mundo, mas ignorar o pensamento do adversário e tampar os ouvidos às objeções são hábitos gerais e infalíveis da intelectualidade esquerdista em toda parte.
Em Thinkers of the New Left (1985), onde examina os principais expoentes de uma escola de pensamento que ainda é a mais influente na esquerda hoje em dia, Roger Scruton observa que nenhum deles jamais deu o menor sinal de querer responder às críticas feitas à teoria marxista por Max Weber, Werner Sombart, F. W. Maitland, Raymond Aron, W. H. Mattlock, Böhm-Bawerk, Popper, Hayek ou von Mises.
Poderia acrescentar Eric Voegelin, Cornelio Fabro, Rosenstock-Huessy, Norman Cohn, Dietrich von Hildebrand, Alain Besançon e uma infinidade de outros autores merecidamente tidos também como clássicos.
No Brasil você não verá nenhum marxista discutindo as objeções de Gilberto Freyre, Mário Ferreira dos Santos, J. O. de Meira Penna, Paulo Mercadante, Antonio Paim, Orlando Tambosi, Ricardo Velez Rodriguez, Gustavo Corção, João Camilo de Oliveira Torres, José Guilherme Merquior.
O marxismo universitário vive e prospera de ignorar a cultura universal das ideéias e sonegá-la aos estudantes. Ao mesmo tempo, infunde neles a impressão sedutora e enganosa de que, por terem lido os autores aprovados pelo Partido, são muito cultos.
Trata-se da forma mais extrema e radical da incultura organizada, da ignorância obrigatória, da burrice prepotente e intolerante.
Enquanto os anticomunistas de todos os matizes não cessam de analisar e refutar o marxismo, escrevendo milhares de livros a respeito, os marxistas fogem sistematicamente ao debate.
Quando não se contentam em baixar sobre os adversários a mais pesada cortina de silêncio, dedicam-se a difamá-los pelas costas, inventando a respeito as histórias mais escabrosas, tratando-os como criminosos, colocando-os em “listas de inimigos” e cumprindo à risca a regra de Lênin: não discutir com o contestador, mas destrui-lo politicamente, socialmente e, se possível, fisicamente.
Que maior prova se poderia exigir de que essas pessoas, que se atribuem o monopólio de todas as virtudes, são as mais perversas, malignas e desprezíveis que já infestaram a profissão intelectual?
A ascensão da escória marxista ao primeiro plano da vida nacional foi e é a causa principal ou única da destruição da cultura superior e do sistema educacional no Brasil.
Com ares de escândalo e indignação, a Folha noticia a descoberta de um plano do governo militar, concebido pelo ministro Alfredo Buzaid nos anos 70, para refrear a infiltração comunista nas universidades e órgãos de mídia. O plano não foi levado a efeito, tanto que a era dos militares foi o período de maior prosperidade da indústria do livro esquerdista no Brasil e a época da conquista da mídia pelos comunistas. Mas o jornal do sr. Frias não perdoa nem a simples ideia. Que horror, que coisa mais tirânica, mais nazista, pensar em impedir o acesso dos comunistas a todas as cátedras, a todas as páginas de jornais, a todos os megafones!
O que o sr. Frias e seus empregados fingem ignorar é que aquilo que a ditadura quis fazer e não fez é exatamente o que os comunistas já fizeram e que já está em plena vigência neste País, com uma amplitude e uma rigidez que ultrapassa tudo o que os militares pudessem ter sonhado em matéria de controle hegemônico dos canais de comunicação e ensino. As gerações mais novas, que não conheceram o Brasil dos anos 50-60, já nasceram dentro dessa atmosfera, que lhes parece normal, e não notam a diferença.
Mas um simples detalhe basta para mostrar o que aconteceu: o ponto de vista cristão-conservador, que era oficialmente o do Estadão, do Globo e parcialmente da própria Folha naquela época, está totalmente excluído, proibido e criminalizado em toda a mídia.
Os editoriais escritos pelos srs. Roberto Marinho e Júlio de Mesquita Filho jamais poderiam ser publicados, hoje, nos próprios jornais que esses homens fundaram, onde o máximo que se permite, num espacinho minoritário, é um pouco de liberalismo chocho e inofensivo, quando não a pura crítica de esquerda a algum desmando ou patifaria mais vistosa do governo petista. Se até essa oposição mole e parcial é hoje abertamente condenada como “extremismo de direita”, é notório que a medida geral de aferição mudou, e quem a mudou foi a própria mídia. E se jornais e canais de TV dão alguma cobertura à Sra. Yoani Sanchez, é precisamente porque esta é anticastrista sem ser anticomunista e suas críticas ao governo cubano são brandas e autocensuradas em comparação com as de outros dissidentes, que contam a história inteira. Estes jamais aparecerão no Globo ou na Folha. E alguém é capaz de imaginar, hoje em dia, uma novela da Globo defendendo os valores cristãos que eram tão caros ao sr. Roberto Marinho?
Por que uma simples intenção não realizada do governo militar deveria ser considerada mais repugnante e assustadora do que o fato consumado, a mesmíssima intenção realizada em muito maior escala pela esquerda triunfante e dominadora, senhora absoluta das páginas da própria Folha? A simples redação dessa mesma notícia já não revela a inversão de critérios, imposta como norma universal e inquestionável que só loucos e extremistas ousariam contestar? O sr. Frias não sabe ler o seu próprio jornal? Não enxerga que ele mesmo foi, em pessoa, um dos artífices do plano do ministro Buzaid realizado com signo oposto?
P. S.: Olavo já fizera referência ao meu livro (hoje esgotado na editora) ainda em 1999, em artigo publicado no Jornal da Tarde.
Abaixo, o artigo citado:
Máfia gramsciana 2 Olavo de Carvalho Jornal da Tarde, 9 de dezembro de 1999
O motivo pelo qual não há nem pode haver debate filosófico neste país já se tornou claro: um grupo de ativistas sem escrúpulos apropriou-se dos meios de difusão cultural para fazer deles o trampolim de suas ambições políticas, fechando os canais por onde pudessem fazer-se ouvir as vozes adversárias e impondo a todo o País a farsa gramsciana da “hegemonia”. A palavra mesma, que tanto veneram fingindo ser termo claro e unívoco, já traz a letal ambigüidade das grandes mentiras. Designa, no sentido intelectual, a amplidão do horizonte de uma visão do mundo que abarca as concorrentes sem ser por elas abarcada. Hegel, por exemplo, é hegemônico sobre todos os marxismos, que quanto mais buscam superá-lo mais se enredam, como viu Lucio Coletti, nos compromissos metafísicos do hegelianismo, e jurando pô-lo de cabeça para baixo só conseguem é plantar bananeira eles próprios (v. o excelente estudo de Orlando Tambosi, O Declínio do Marxismo e a Herança Hegeliana , Florianópolis, UFSC, 1999). A máfia gramsciana, quando chama Gramsci de hegemônico, deseja induzir-nos a crer que ele o é nesse sentido. Mas ela sabe que não é, pois um breve exame das filosofias do século 20 mostra que nelas há mundos e mundos inabarcáveis e invisíveis aos olhos desse pobre sapo filosófico, espírito escravo que, fingindo-se de livre e universal, tudo comprime e reduz às dimensões mesquinhas do seu poço escuro e proclama que o céu é apenas um buraquinho no teto. Gramsci nunca foi um filósofo, foi apenas um sistematizador de truques sórdidos para falsificar o saber e torná-lo instrumento de poder nas mãos do Partido. Se o gramscismo fosse hegemônico no sentido intelectual, ele se imporia pela força das suas demonstrações, como se impuseram por exemplo as filosofias de Aristóteles e de Leibniz. Mas estes nunca precisaram ter a seu serviço um exército de “ocupadores de espaço”, semeadores do silêncio forçado onde germine a falsa glória do monólogo restante. Quando, na Idade Média, um aristotélico desejava vencer um adversário, não pensava em tomar-lhe o emprego, em encobrir seu discurso sob a gritaria uníssona de uma ralé de militantes pagos. Chamava-o para o debate em campo aberto, mesmo quando isso importasse, como importou para Santo Alberto, em atrair a ira dos poderosos. Para derrotar os empiristas, Leibniz não tratou de boicotá-los na distribuição das verbas de pesquisa, de omitir seu nome das publicações culturais, de monopolizar contra eles o apoio milionário dos senhores da mídia. Simplesmente escreveu um livro fulminante em forma de debate com o príncipe deles, John Locke, ainda que ao preço de ver-se exposto à chalaça grosseira de filósofos de salão. Os escolásticos e Leibniz desconheciam a hegemonia no sentido gramsciano, e se a conhecessem não veriam nela senão a criação doentia de uma mentalidade torpe. Para ilustrar do que se trata, nada mais elucidativo do que a conduta recente de uma tal dona Marilena, que, denunciada por mim como praticante do característico estilo elíptico-mistificatório de raciocínio gramsciano, ficou caladinha ante o público da cidade onde mora, mas foi dizer lá longe, lá em Goiás, que não me conhece nem leu, mas que, segundo informação confiabilíssima obtida de fonte anônima, sou indiscutivelmente “um pulha”. O jornalista José Maria e Silva, do jornal Opção de Goiânia, já deu a essa criatura a resposta devida, e cito o caso apenas como amostra dos métodos gramscianos de conquista da hegemonia: jogo de poder, manobra soturna para frustrar o debate, boicotar o adversário e vencer por uma impressão postiça de unanimidade espontânea. Quando essa gente trombeteia que uma edição completa de Gramsci vai “renovar o pensamento nacional”, o que anuncia é nada menos que a “renovação por estrangulamento”. Pois que estrangulem o quanto queiram. Eu, da minha parte, lhes digo o que vou fazer: vou furar o bloqueio, por meio do JT e de quantos outros respiradouros ainda restem na imprensa nacional. A cada novo volume de escritos do anãozinho maluco que vocês publicarem, vou responder com argumentos que demonstrarão a sua total vacuidade filosófica e a índole brutal de sua doutrina fingidamente humanóide. Vocês, como sempre, vão ficar rosnando pelos cantos e tramando maldades. E vão falar mal de mim bem longe de Goiás, pois já viram que goiano não é idiota. |
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