A suspensão, pela diretoria do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da divulgação dos resultados trimestrais da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) - que apresenta a situação do mercado de trabalho no País - deixa claro que, se for necessário para evitar que informações eventualmente negativas sobre o desempenho da economia causem danos à candidatura da presidente Dilma Rousseff à reeleição, o governo do PT não hesitará um segundo para intervir em qualquer órgão público. Nem mesmo instituições como o IBGE, que construíram ao longo dos anos uma reputação reconhecida internacionalmente pela qualidade e isenção de seu trabalho e produzem informações essenciais para a formulação de políticas públicas e para decisões das empresas privadas e das famílias, escapam da volúpia petista pela permanência no poder.
A revolta do corpo técnico da Diretoria de Pesquisas da instituição, responsável pela produção dos principais indicadores por ela divulgados regulamente, não deixa dúvidas quanto ao caráter político da decisão. A diretora Marcia Quintslr, que se opunha à interrupção da divulgação dos resultados, demitiu-se do cargo que ocupava desde 2011 tão logo a suspensão foi anunciada. Em nota, coordenadores e gerentes estratégicos da Diretoria de Pesquisas disseram ser "insustentável" sua permanência nos cargos caso a suspensão seja mantida.
A constatação, pela Pnad Contínua, de que o desemprego médio no País em 2013 foi de 7,1% deve ter provocado grande irritação entre os membros do governo que acumulam a função de organizadores da campanha eleitoral de Dilma. Eles estavam acostumados a outro indicador, a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) também aferida pelo IBGE, que tem apontado para um desemprego em torno de 5% - número que certamente tem impacto eleitoral muito mais favorável para a candidatura oficial do que o da Pnad Contínua.
São, porém, pesquisas diferentes, baseadas em metodologias e critérios diferentes e com abrangências igualmente diferentes (a PME limita-se a seis regiões metropolitanas; a Pnad Contínua tem alcance nacional), daí a discrepância de seus resultados num determinado momento.
Ao anunciar a suspensão da divulgação dos resultados trimestrais da Pnad em 2014 - a próxima estava marcada para o dia 27 de maio - e o reinício dos anúncios em janeiro de 2015, quando o vencedor da eleição presidencial já tiver tomado posse, a diretoria do IBGE tentou justificá-la com argumentos técnicos. Entre outros, a direção do instituto alegou, em comunicado, que a suspensão é necessária para eliminar da pesquisa dúvidas e questionamentos, entre os quais a respeito de renda domiciliar per capita, que será utilizada para definir as quotas de Estados e municípios nos respectivos fundos de participação em tributos federais.
Os técnicos da Diretoria de Pesquisas consideraram "inaceitável" essa alegação e também a decisão de refazer o calendário de divulgação dos resultados da Pnad Contínua. Documentos técnicos publicados pelo IBGE e declarações da presidente da instituição, Wasmália Bivar, à imprensa mostraram que há tempos a metodologia da pesquisa não precisa mais ser revista ou testada.
A metodologia é utilizada desde 2006 e a Pnad Contínua começou a ser realizada em caráter excepcional em outubro de 2011, em pelo menos 20 regiões metropolitanas, além de cinco capitais estaduais e no Distrito Federal. Em janeiro de 2012, foi estendida para todo o território nacional e, de acordo com as Notas Metodológicas publicadas pelo IBGE no início deste ano, desde então faz parte do conjunto de pesquisas do instituto.
Em setembro do ano passado, em entrevista ao jornal Brasil Econômico, a presidente do IBGE afirmou que, "quando começarmos a produzir, teremos que divulgar um cronograma e não poderemos parar". O cronograma foi amplamente anunciado no início deste ano (os dois primeiros resultados foram divulgados na data prevista), mas, por alguma razão, Wasmália e outros diretores do IBGE decidiram suspender a divulgação. Não foi por razões técnicas.
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Direção do IBGE tenta impedir exoneração coletiva
O conselho diretor do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística reuniu-se na tarde desta sexta-feira (11) com o corpo técnico da instituição num esforço de tentar evitar que haja um pedido de exoneração coletivo. Em carta ao conselho, 18 coordenadores e gerentes estratégicos de pesquisas importantes da instituição ameaçavam entregar seus cargos caso a direção não voltasse atrás na decisão de suspender as divulgações da Pnad Contínua até janeiro do ano que vem.
A presidente do IBGE, Wasmália Bivar, disse em entrevista que ainda não pode afirmar se conseguirá evitar a saída coletiva dos coordenadores, mas que vai explicar as motivações para a decisão. A medida já motivou o pedido de exoneração da diretora de Pesquisas do IBGE, Marcia Quintslr, e da coordenadora-geral da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence), Denise Britz do Nascimento Silva. Ambas integravam o conselho diretor do IBGE ao lado de Wasmália e de outros cinco membros.
"No momento, não posso afirmar (que não haverá debandada), mas tenho certeza que após uma conversa e após explicarmos um pouco melhor as nossas motivações, acredito que eles vão reverter, em função dos seus próprios compromissos com o IBGE", afirmou Wasmália.
A presidente do instituto disse que cabe aos gestores tomarem as decisões difíceis, que não podem ser tomadas pela área técnica. "A última decisão, que foi o adiamento da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares), não foi uma decisão técnica, foi uma decisão institucional. Quem toma as decisões institucionais é o corpo gestor da casa. Nunca a área técnica. E a área técnica faz muito bem de estar sempre defendendo a manutenção de tudo. Esse tipo de manifestação não me surpreende. Mas tem que se considerar que não é uma decisão técnica, é uma decisão institucional", ressaltou.
Entre os coordenadores que ameaçaram entregar seus cargos numa carta enviada ao conselho diretor estão Eulina Nunes dos Santos, responsável pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), e Cimar Azeredo, responsável pelas taxas de desemprego apuradas pela própria Pnad Contínua e pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME).
"O nosso corpo técnico tem um enorme compromisso com a casa, com seus projetos e com as suas informações. Tenho certeza de que vai prevalecer, na verdade, é a responsabilidade com isso", considerou Wasmália.
Segundo ela, a carta é uma reação legítima à saída da diretora de Pesquisas, funcionária de carreira do IBGE. "Além disso, o conselho diretor fez algo que foi um pouco diferente do que usualmente fazemos. Usualmente, informamos à casa nossas decisões e depois informamos o público externo. No entanto, diante da gravidade do problema, desta vez, nós invertemos", lembrou.
O anúncio sobre a suspensão da Pnad Contínua foi feito por Wasmália à imprensa, logo após a divulgação dos dados referentes ao terceiro e quarto trimestres de 2013. A imprensa foi alertada antes dos servidores do instituto. "Temíamos que essa notícia surgisse antes de o próprio IBGE anunciá-la. Era muito importante que o IBGE fizesse esse anúncio. Agora, em relação às equipes técnicas, elas não foram devidamente informadas. Não tivemos oportunidade de nos reunir com elas e discutir nossas motivações. Isso vai ser feito agora", reconheceu.
Fonte: Agência Estado