Segue abaixo o meu artigo de hoje no Valor Econômico. Neste artigo eu queria destacar quatro coisas: (1) É muito difícil escolher em quais setores uma economia vai se especializar; (2) aumento da produtividade do trabalho via educação é bom para economia independentemente do setor que emprega o trabalhador. Importante é produzir qualquer produto de forma mais eficiente; (3) focar no desenvolvimento de algumas empresas de elite, o que chamo de enclaves de produtividade, não solucionará o nosso problema de baixa produtividade; e (4) a agenda de reformas não é uma agenda fechada que se esgota com um governo reformista. Essa agenda é continua, um esforço contínuo do governo para melhorar o funcionamento da economia de mercado.
Desafio do aumento da produtividade
Por Mansueto Almeida
Valor Econômico, 06 de fevereiro de 2013
Há hoje no Brasil uma preocupação com o aumento da produtividade. Uma economia cresce pela incorporação de mão de obra no processo produtivo, pelo aumento do investimento em capital físico (máquinas e equipamentos) e pelo uso mais eficiente que se faz desses fatores, o que os economistas chamam de “produtividade total dos fatores (PTF)” – produzir mais produtos com a mesma quantidade de mão de obra e capital empregados.
Não há na teoria econômica uma lei rígida que diga que o crescimento da produtividade antecede ou decorre da acumulação de capital e trabalho. É possível que surtos de crescimento comecem pelo maior uso de fatores de produção ociosos, que levaria a um crescimento da produtividade, como é possível o contrário, reformas econômicas tornariam a economia mais eficiente (aumento de produtividade), o que estimularia o aumento do investimento.
É consenso entre economistas que o crescimento sustentável de uma economia está ligado ao crescimento da produtividade total dos fatores. Mas exatamente o que um país pode fazer para que a produtividade cresça mais depressa não é consensual.
Para alguns economistas, a forma de aumentar a taxa de crescimento da produtividade é deslocando fatores de produção de atividades “tradicionais” para as que, pela sua própria natureza, exigem o emprego de mão de obra mais qualificada e investimento maior em pesquisa e desenvolvimento (P&D), o que levaria a mais inovação. Em uma linguagem mais simples, seria melhor investir na indústria farmacêutica e em indústrias intensivas em tecnologias do que no setor de vestuário e calçados.
O problema com esse tipo de argumento é que, se todos os países do mundo quisessem incentivar apenas um conjunto de empresas em atividades intensivas em tecnologia, quase todos produzirão medicamentos e eletrônicos e uns poucos produzirão alimentos. No final, pode até ser mais vantajoso para alguns países produzirem soja e cobrar um fortuna do resto do mundo.
Adicionalmente, o mundo do século XXI é diferente da dicotomia clássica da primeira metade do século XX, quando atividades agrícolas e extrativas eram necessariamente sinônimos de baixa produtividade. Esse não é mais o caso. Alguns produtos agrícolas são mais intensivos no uso de tecnologia do que a montagem de alguns produtos eletrônicos.
No mundo atual é cada vez mais difícil apostar em setores. A tecnologia está embutida tanto em remédios e carros, quanto em roupas, sapatos e alimentos. Assim, a preocupação não deveria ser com o que um país produz, mas como se produz.
Outro grupo de economistas argumenta que é muito difícil planejar a composição setorial de um país. Assim, o que possibilitaria um crescimento mais rápido da produtividade seria maior abertura da economia, que levaria a uma melhor alocação dos fatores de produção; a melhoria do ambiente de negócios, que permitiria que as firmas de baixa produtividade fossem expulsas do mercado pelas de maior produtividade; maior investimento em educação e reformas que tornassem mais flexíveis o funcionamento do mercado de trabalho; recuperação de dívidas, etc.
É verdade que o termo “reformas econômicas” é genérico demais para se transformar em uma agenda clara de política econômica. Por exemplo, as reformas econômicas feitas na China desde 1978 foram todas parciais, um conjunto de “remendos mal acabados” em um país com o mínimo de segurança jurídica, mas que funcionaram. Nem por isso, deve-se desprezar ou subestimar a importância das reformas macro e microeconômicas.
Primeiro, melhorar os investimentos em educação e ter um esforço contínuo de melhoria da qualidade, mesmo que depois o trabalhador queira plantar maçã e não produzir circuitos integrados, ajuda o crescimento da produtividade da economia. Adicionalmente, uma mão de obra mais escolarizada torna mais fácil a transferência de tecnologia de outros países e inovação no “chão da fábrica”.
Segundo, facilitar a abertura e fechamento de empresas e diminuir a burocracia não será a solução para o nosso problema de competitividade, mas contribui com esse objetivo.
Terceiro, incentivar P&D e inovação em todos os setores é algo que também ajuda o crescimento da produtividade, ainda mais se incentivos à inovação forem acompanhados de maior concorrência decorrente da maior abertura comercial. O Brasil ainda é uma economia excessivamente fechada e o país com menor relação importação e Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Banco Mundial.
O que ninguém pode garantir é a magnitude do efeito das “reformas econômicas” no crescimento do PIB, nem mesmo a defasagem entre aprovação de reformas e o seu efeito no crescimento. A agenda de reformas não deve ser entendida como uma “força tarefa” para mudar a economia em um ou dois anos, mas como um esforço contínuo para melhorar o funcionamento da economia de mercado. A agenda de reformas nunca termina.
Adicionalmente, no caso do Brasil, não há como o Estado ajudar individualmente as mais de 4,5 milhões de empresas que existem, segundo Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) do IBGE. Não é solução também dar tratamento privilegiado para algumas poucas e criar “enclaves de produtividade”. É por isso que medidas horizontais são importantes.
No curto prazo, a melhor forma de aumentar o crescimento do Brasil é com o aumento do investimento privado e público. No longo prazo, que perpassa o governo atual, não há alternativa que não seja a retomada da agenda de reformas, mesmo que essa retomada ocorra de forma gradual.