Meu colega economista Armínio Fraga, ex-diretor e ex-presidente do Banco Central do Brasil, deu uma brilhante entrevista hoje ao Valor Econômico. Há um grupo de pessoas que ganham a vida tentando distorcer o que Armínio fala, apesar dele ser uma dos poucos economistas com um conhecimento forte da literatura acadêmica e do mundo real.
Apesar de sua carga de trabalho, Armínio ainda estava lecionando na PUC no último ano e tem um contato privilegiado com a academia brasileira, setor empresarial e “policymakers” do resto do mundo. Enquanto muita gente tenta entender algumas provocações do “Joseph Stiglitz” em um dos seus artigos, Armínio manda um e-mail e/ou fala diretamente com o economista. Foi aluno do Stiglitz por duas vezes no início da década de 1980.
Mas o que mais me impressiona no Armínio é sua enorme paciência. Uma vez, quando era presidente do Banco Central, presenciou uma manifestação do Movimento dos Sem Terra (MST) na porta do Banco Central e mandou formar uma comissão para subir e conversar com ele. Ele calmamente explicou para a comissão do MST qual era o papel do BACEN. Uma vez uma repórter me falou que, quando era presidente do BACEN, era comum Armínio descer às 10 da noite da sala da presidência do Banco e conversar com jornalistas.
Depois dessa breve introdução, escrevo para falar que Armínio mostra no Valor de hoje os problemas que temos que resolver. Destaco alguns pontos e muita gente boa do BACEN, Tesouro e Min. da Fazenda (estou falando aqui dos técnicos concursados que não têm opção a não ser seguir ordens dos seus superiores) concordaria com algumas das afirmações do Armínio. Por exemplo:
1) Incerteza a e pessimismo: “A economia está fraca, assustada e muito defensiva, com pouco investimento e pouca ousadia. A incerteza tem uma dimensão macroeconômica ligada ao baixo crescimento, à inflação alta e ao déficit em conta corrente; e uma dimensão mais micro, que afeta cada setor de uma maneira diferente. Mas, no geral, assusta, com raízes importantes no setor elétrico, de petróleo, que não são os únicos, mas são os principais. Esse quadro precisa ser abordado de maneira clara e isso não está acontecendo.”
2) Crescimento do consumo: “A fase de crescimento acelerado do consumo pode ter ficado para trás porque o PIB não está crescendo, as famílias se endividaram bastante e os juros estão subindo. Mas há um espaço enorme para o consumo crescer. Só que a renda tem que crescer junto, o custo do capital tem que cair e os prazos têm que se alongar.“
3) Desemprego: “A semente do desemprego já está aí, pois infelizmente a economia não está crescendo. Para reduzir a inflação e evitar o desemprego será necessário afetar as expectativas. Falta hoje transparência nas contas públicas e compromissos com a responsabilidade fiscal e com inflação na meta. O ritmo de queda terá que ser avaliado à medida que fique claro o tamanho do atraso em alguns preços.”
4) Política Social: “Há duas frentes de trabalho que deveriam ser não ideológicas. Uma diz respeito ao lado da igualdade de oportunidade. Mesmo o mais liberal dos liberais tende a defender a igualdade de oportunidade. Claro que muitos liberais veem um papel para o governo na provisão da educação e da saúde pública e não necessariamente na produção. Vi isso em uma entrevista recente do Ricardo Paes de Barros [subsecretário de Ações Estratégicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos], por exemplo. A provisão cabe ao governo na educação, saúde, segurança, um Judiciário decente, transporte público de qualidade. Essa é a base para uma sociedade onde as pessoas têm chances, onde o filho de uma pessoa pobre não está condenado a ser pobre. Isso é um desejo do Brasil, está na Constituição e o governo deveria estar entregando mais nessas áreas. Esse é um canal de resposta muito poderoso à questão colocada por Piketty.”
5) Crescimento econômico e progresso social: .”….Temos que cair na real: as coisas não estão dando certo. O país não está crescendo e, se não crescer, as frustrações vão aumentar. Estudiosos como o Ricardo Paes de Barros e o Marcelo Neri [ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos] têm escrito e dito ao longo dos anos que um percentual alto da queda da pobreza e da redução da desigualdade veio do crescimento. Do crescimento. Não é do programa distributivo, do Bolsa Família. Você está falando com alguém que não tem vergonha de dizer que é um liberal com coração. É importante o país crescer e é importante gastar melhor, sim.”
Vou parar por aqui porque não quero que o Valor me processe por copiar conteúdo protegido. Comprem o jornal e leiam a entrevista que está muito boa. E cabe a cada um de vocês decidir com o que concordam e discordam das teses do economista. Não deixem ninguém interpretar por vocês (eu inclusive).