Vivendo para os livros... e a escrita - Paulo Roberto de Almeida
Diplomacia e Relações Internacionais

Vivendo para os livros... e a escrita - Paulo Roberto de Almeida



A arte de escrever para si mesmo

Paulo Roberto de Almeida

No decorrer da maior parte da minha vida, talvez quatro quintos de uma existência dedicada à constante leitura de livros, à reflexão solitária e à redação regular de textos de diversos tipos, o que mais fiz, de fato, foi escrever para mim mesmo.
Salvo no período mais recente, quando tenho aceito (talvez muito facilmente, e em excesso) compromissos de colaborar com revistas ou livros coletivos, a maior parte de meu tempo livre, durante os últimos quarenta anos, tem sido ocupada pela redação de textos que só tinham um único destinatário: eu mesmo.
Não por outra razão, minha lista de originais é três vezes mais volumosa do que a correspondente aos trabalhos publicados. Na verdade, minha lista de originais cobre apenas uma parte modesta de meus escritos, aquela de trabalhos efetivamente terminados, com um ponto final, assinados, datados e localizados, e finalmente numerados na ordem sequencial de seu término, não importando quando e onde iniciados.
Os trabalhos apenas esquematizados, iniciados, mas não concluídos, comporiam uma lista ainda mais longa, se por acaso tal lista existisse. Eles estão dispersos, perdidos numa infinidade de pastas, guardadas por sua vez em outras pastas, sem muita ordem ou método, quase sem títulos evocativos, a não ser os de alguma inspiração momentânea. Em todo caso, essas centenas, talvez mais de um ou dois milhares, de working files compõem uma formidável armada – ou exército, como se queira – de reserva, aguardando retomada oportuna em algum tempo livre (que, sabemos todos, nunca virá). Só sei dizer que esses working files, escritos unicamente para mim, nunca entraram na pasta “PRAworks”, organizada em listas anuais (como para a lista de Publicados). Eles ficam simplesmente dispersos, por vezes sob títulos enigmáticos, em pastas dotadas de rótulos anódinos, o que dificulta sobremaneira sua recuperação ulterior para finalização. Muitos estão até esquecidos, coitadinhos, relegados a um limbo do qual até a intenção ou propósito iniciais também há muito se perderam. Esta é mais uma prova, além da quantidade enorme de inéditos, de que eu realmente escrevo para mim mesmo.
Mas mesmo naqueles escritos “encomendados”, eu jamais aceitei qualquer sugestão de linhas “condutoras”, estilo discursivo ou orientação argumentativa, tanto porque sou eu mesmo quem decido como e com quais objetivos desenvolverei minha linha de raciocínio. Nisso sou absolutamente libertário, inclusive já o era mesmo nos textos oficiais, nos quais sempre escapei do diplomatês insosso no qual se deleitam tantos colegas de carreira.
Estas são, finalmente, as características da arte de escrever para si mesmo: livre inspiração, total controle do estilo e do método de abordagem, independência de pensamento e plena autonomia argumentativa, decisão solitária sobre como e onde divulgar ( o que não é o mesmo que publicar, já que isto depende de algum editor de revistas ou livros).
Em todo caso, com uma dezena e meia de livros publicados em autoria solitária, meia dúzia de títulos editados por mim e várias dezenas de capítulos em livros coletivos, não posso dizer que eu esteja carente de editores. Recebi, é verdade, convites de editores para compor, ou seja, escrever eu mesmo, tal ou qual livro, mas declaro imediatamente que, a despeito de ter considerado certas sugestões, nunca levei adiante qualquer uma dessas demandas; tampouco ofereci projetos de livros a editores: faço apenas o que me dá vontade. Recém aceitei fazer um “sob encomenda”, sobre a integração regional, mas apenas porque eu teria total controle sobre o que e como escrever.
Repito, e finalizo: eu escrevo para mim mesmo, leitores são apenas um detalhe do processo (com perdão dos próprios). Como não vivo do que escrevo – pelo menos ainda não – não preciso agradar qualquer público quanto à forma ou o conteúdo daquilo que produzo, em total autonomia. Se, ao cabo de alguns laboriosos exercícios de escrita, chego ao que considero a forma final de algum trabalho, e aprovei o que eu mesmo escrevi, coloco um ponto final, acrescento o local e a data (eventualmente consignando algumas etapas precedentes), registro, finalmente, na lista numérica dos originais e me dou por satisfeito. Quanto ao julgamento dos eventuais (e poucos) leitores, creio que eles devem dispor de tanta liberdade de avaliação quanto a que eu tive na concepção e redação desses meus textos.
Ponto final, a mais um! Vale!

Brasília, 15 de julho de 2012.



loading...

- Indulging With Myself: Estatisticas De Trabalhos Produzidos E Publicados, 1964-2014
Indulging with myself: estatísticas de trabalhos produzidos e publicados entre 1964 e 2014 Paulo Roberto de Almeida(www.pralmeida.org; http://diplomatizzando.blogspot.com) Uma pequena digressão em torno das estatísticas de produção e de publicação...

- Balanço Geral Ao Final De 2014: Algumas Estatísticas - Paulo Roberto De Almeida
Balanço geral ao final de 2014: algumas estatísticas:Contabilidade elementar de um ano produtivo Paulo Roberto de Almeida(www.pralmeida.org; http://diplomatizzando.blogspot.com) Todo final de ano, assim como os começos de um novo ano, na...

- Balanços De Final De Ano: Um Exercício Interminável - Paulo Roberto De Almeida
Balanços de Final de Ano: um exercício interminável Paulo Roberto de Almeida Pretendo, neste que deve ser o último trabalho do ano de 2011, tecer, em primeiro lugar, algumas considerações sobre o que consegui realizar no ano que agora se conclui;...

- Diplomacia Lulista: Desenterrando Velhos Escritos... (pra)
Parece incrível, mas acontece. Escrevo tanto (deve ser uma mania, talvez uma compulsão, mais provavelmente um vício e uma loucura terminal, mas que ainda não me matou...), e publico tanto (e nem sempre me avisam quando alguma coisa minha saiu em algum...

- Um Escritor Que Sabia Escrever: Otto Maria Carpeaux
Parece redundância, ou erro de título, mas não é: hoje em dia, são poucos os escritores que sabem escrever, sobretudo no jornalismo. Minha homenagem a um mestre da escrita. OBSERVATÓRIO LITERÁRIO Um erudito que sabia escrever Esdras do Nascimento...



Diplomacia e Relações Internacionais








.