Israel-Hamas: o posicionamento de Denis Lerrer Rosenfield
Diplomacia e Relações Internacionais

Israel-Hamas: o posicionamento de Denis Lerrer Rosenfield


Ignomínia
Todos os recursos do Hamas são canalizados para o treinamento militar
Denis Lerrer Rosenfield
O Globo, 28/07/2014

Certa cobertura jornalística e posicionamentos de determinados governantes, aí incluindo a diplomacia brasileira, deveriam fazer parte de uma história da ignomínia. Versões tomam o lugar de fatos, a ideologia vilipendia a verdade e terroristas são considerados como vítimas inocentes.
Os episódios protagonizados pela ONU, em Gaza, deveriam escandalizar qualquer pessoa sensata. Em duas escolas da ONU foram encontrados foguetes, lá depositados pelos grupos jihadhistas. Supõe-se que lá não chegaram caminhando sozinhos, mas contaram com uma explícita colaboração de funcionários da própria organização internacional. Trata-se de uma clara violação da lei internacional.
A ONU, curiosamente, não quis fornecer as fotos desses foguetes, pois elas teriam forte impacto midiático, mostrando o pouco caso do Hamas com as crianças e mulheres que diz, para a imprensa internacional, defender. Ou seja, a organização fez o jogo do terror, pretendendo, porém, apresentar-se como neutra. Ademais, posteriormente, entregou os mesmos foguetes para as “autoridades governamentais”, isto é, o próprio Hamas!
Nada muito diferente do que aconteceu na guerra passada. Durante semanas fomos bombardeados, com manchetes, de que uma sede da ONU teria sido bombardeada pelas Forças Armadas de Israel. Era uma mentira deslavada. A própria organização internacional demorou, no entanto, 30 dias para fazer o desmentido. Como assim? O desmentido apareceu um mês depois nas páginas internas de jornais, como uma pequena notícia irrelevante. O estrago midiático foi feito com a colaboração da própria ONU.
E quando digo que o Hamas não se preocupa com a vida de crianças, idosos e mulheres quando fala para a imprensa internacional, refiro-me apenas a um fato. Em seu estatuto, essa organização terrorista prega abertamente a “educação” das crianças para a “guerra santa”, inculcando em suas mentes que devem estar preparadas para o martírio.
Várias lideranças do Hamas também têm dito claramente que elas utilizam mulheres e crianças como “escudos humanos”, embora a sua apresentação seja, evidentemente, a do combate pelo Islã, onde vidas devem ser sacrificadas. Por que divulgação não é dada a este fato?
As Forças Armadas israelenses são cuidadosas do ponto de vista de preservação de vidas humanas. Telefonam e enviam mensagens às populações das áreas que serão bombardeadas. Ocorre que o Hamas impede que essas pessoas possam escapar, com o intuito de produzir o maior número de vítimas civis, que logo serão filmadas e fotografadas. São essas imagens que serão utilizadas para a formação da opinião pública mundial. É macabro!
O Terror se caracteriza por não ter nenhuma preocupação com a vida dos civis. Assim é com os mais de dois mil foguetes lançados contra o Estado de Israel. Assim é com os comandos que foram enviados para assassinar a população civil dos kibutzim próximos à fronteira. Assim é com os palestinos que se tornam reféns e vítimas dessa estratégia terrorista.
O Hamas se mistura com a população civil. Utiliza escolas, mesquitas, instalações da ONU e hospitais como esconderijos de armamentos e bases de seus ataques. Seus dirigentes máximos estão alojados em um bunker em um hospital na cidade de Gaza. Vivem também em seus túneis, que são inacessíveis para a população civil que, lá, poderia se proteger.
O Estatuto do Hamas é um claro libelo antissemita, que busca pura e simplesmente a destruição do Estado judeu: “Israel existirá e continuará existindo até que o Islã o faça desaparecer, como fez desaparecer a todos aqueles que existiram anteriormente a ele.”
O seu alvo são os judeus e os cristãos. Aliás, esses últimos já são as vítimas do terror por organizações jihadistas na Síria e no Iraque. Assim está escrito: “Fazei o bem e proibis o mal, e credes em Alá. Se somente os povos do Livro (isto é, judeus [e cristãos]) tivessem crido, teria sido melhor para eles. Alguns deles creem, mas a maioria deles é iníqua.”
Para eles, os judeus fazem parte de uma grande conspiração internacional, à qual terminam associando também os cristãos. Utilizam, para tal fim, um livro antissemita do século XIX, forjado pela polícia czarista, para justificar o massacre de judeus. Eis o Estatuto: “O plano deles está exposto nos Protocolos dos Sábios de Sião, e o comportamento deles no presente é a melhor prova daquilo que lá está dito.” Mais clareza impossível, porém alguns teimam em não ler. É a miopia ideológica.
Enganam-se redondamente os que dizem que o Hamas procura a negociação. Para eles: “Não há solução para o problema palestino a não ser pela jihad (guerra santa)”, isto é, o extermínio dos judeus.
Israel aceitou todas as propostas de cessar-fogo, relutando, mesmo, em empreender a invasão terrestre. O que fez o Hamas: não cessou o lançamento de foguetes e rompeu todas as tréguas. Aliás, foi coerente com os seus estatutos: “Iniciativas de paz, propostas e conferências internacionais são perda de tempo e uma farsa.”
Neste contexto, falar de “desproporcionalidade” na resposta militar israelense revela desconhecimento ou má-fé. O país não poderia continuar vivendo sob o fogo de foguetes, como se aos judeus estivesse destinado viver debaixo da terra, em abrigos subterrâneos. Aliás, essa é uma boa distinção entre Israel e o Hamas. Os abrigos são para os civis, enquanto em Gaza são para os terroristas.
Observe-se que todos os recursos do Hamas são canalizados para o treinamento militar, a construção de túneis (agora de ataque) e a compra de armamentos e foguetes. O resultado está aí: a miséria de sua população.
As manifestações pró-Hamas que tiveram lugar em Paris tiveram a “virtude” de mostrar sua natureza antissemita, onde se misturam declarações contra o capitalismo, morte aos judeus e ataque a sinagogas. Tiveram, por assim dizer, o “mérito” da coerência. Esse setor da esquerda se associa ao terror, expondo toda a sua podridão. Será que certos setores da esquerda brasileira estariam trilhando também esse caminho da ignomínia?

Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul



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