Eleicoes 2014: a política externa brasileira e os candidatos - Marcelo de Paiva Abreu
Diplomacia e Relações Internacionais

Eleicoes 2014: a política externa brasileira e os candidatos - Marcelo de Paiva Abreu


Política externa do outro lado das eleições
Marcelo de Paiva Abreu*
O Estado de São Paulo, quarta-feira, 14.5.2014

Em um mundo de sonhos, programas eleitorais deveriam refletir as reais intenções dos candidatos quanto às políticas que implementariam caso fossem eleitos. Na prática, preocupações com os interesses de curto prazo dos eleitores tendem a complicar esse quadro. Não é surpreendente que políticos em campanha omitam ou mesmo deformem a verdade, de olho no impacto eleitoral de suas promessas. Isso é agravado quando a disputa se refere a um país que enfrenta situação crítica.
No Brasil de 2014 observa-se um caso extremo dessa situação. No terreno econômico, o cenário é de inflação alta e crescimento medíocre, contas públicas deterioradas, carga tributária excessiva e investimento reduzido. Isso à beira da crise energética que pode revelar-se desastrosa e em meio à mais grave que a Petrobrás já enfrentou. Na política, a queda da popularidade da presidente reflete-se na fragmentação da "Armata Brancaleone" que caracterizava o rolo compressor governista desde 2003. Há um clima de intensa insatisfação popular.
A candidata da situação optou por estratégia que combina a distribuição de benesses eleitoreiras com, no melhor dos casos, postura de avestruz. Recusa-se a ver a gravidade da situação que o País enfrenta. Os candidatos da oposição têm consciência das dificuldades a enfrentar, mas têm sido comedidos quanto ao que seria necessário para colocar o País de volta aos trilhos da viabilidade. Isso se aplica especialmente à área econômica. A explicitação em detalhe das políticas necessárias, por exemplo, para que a inflação volte ao centro da meta ou para que, sem aumento da carga tributária, se melhore o desempenho do governo conflita com os objetivos eleitorais.
Há, entretanto, temas que são menos marcados pelo realismo dos cálculos eleitorais. Um deles é a política externa. É difícil de imaginar que diferentes propostas sobre o que será a futura política externa possam fazer a diferença na votação dos diferentes candidatos, embora sejam importantes para avaliar a sua adequação para ocupar a Presidência.
A política externa brasileira entre 2003 e 2014, alegada projeção externa da preponderância interna do PT, é considerada competente por Dilma Rousseff, ao alinhar o Brasil ao "Terceiro Mundo", em especial aos regimes populistas de esquerda na Venezuela e na Argentina, e distanciar-se dos países desenvolvidos. Pode-se, portanto, esperar que a política externa continue sendo formulada no Itamaraty do B, dentro do Palácio do Planalto, e sem grandes reorientações. Medíocre está, medíocre continuará.
A candidatura Eduardo Campos enfrenta problemas quanto ao tema. Há uma ala do PSB que endossa a política externa do atual governo e outra que percebe a sua mediocridade. Haveria o risco de Roberto Amaral passar a ocupar o lugar de Marco Aurélio Garcia? Marina Silva seguramente terá aí um papel.
Aécio Neves foi o candidato que mais claramente explicitou suas ideias sobre o tema: o Itamaraty deveria recuperar a sua posição central no processo decisório relativo à política externa, abandonando o viés ideológico. Deveria defender os efetivos interesses nacionais e buscar celebrar acordos comerciais com países desenvolvidos.
Será tão simples? O que explica a captura do Itamaraty - a despeito da sua tradição de "esprit de corps" - por um reduzido grupo de funcionários que colaboraram com a estratégia definida no Palácio do Planalto? O que é mesmo interesse nacional? Qual poderia ser o papel de um conselho com representação independente do governo para a definição da política externa? Será que o Itamaraty deveria ser o principal responsável pela política comercial? Ou o tema seria mais bem tratado no Ministério da Fazenda? Ou em uma versão brasileira do United States Trade Representative? São perguntas cujas respostas vão bem além de declarações de boas intenções.
*Marcelo de Paiva Abreu é doutor em Economia pela Universidade de Cambridge e é professor titular no departamento de Economia da PUC-Rio. 



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