Brasil e bônus demográfico: crônica de uma tragédia anunciada - Paulo Roberto de Almeida
Diplomacia e Relações Internacionais

Brasil e bônus demográfico: crônica de uma tragédia anunciada - Paulo Roberto de Almeida


Brasil e bônus demográfico: crônica de uma tragédia anunciada
Paulo Roberto de Almeida

Por “tragédia anunciada”, ou apenas antecipada, desejo referir-me ao fato – na verdade ainda uma hipótese – de que o Brasil vai perder a chance única de que dispõe como sociedade para crescer e ficar rico no momento de maior potencialidade produtiva de sua população, fenômeno conhecido como “bônus demográfico”, ou seja, a melhor (e maior) relação possível entre o número de ativos e o de dependentes na sociedade. Dentro de 25 a 30 anos essa relação não apenas vai se inverter, como a situação vai começar a ficar mais preocupante, em termos de maiores despesas com a terceira idade, e uma riqueza acumulada insuficiente para cobrir despesas de saúde e as previdenciárias.
Observando o que tivemos de 2003 até aqui, e que promete prolongar-se de 2014 até 2022, eu ousaria antecipar uma imensa perda para o Brasil: pelo menos metade do bônus demográfico será desperdiçado em distributivismo demagógico, com uma deterioração ainda maior dos padrões educacionais (em todos os níveis, com uma mediocrização absoluta e relativa de todos os ciclos educacionais, tendo em conta as “pedagogas freireanas” que dominam a educação no Brasil, as novas saúvas do nosso pais), e uma perda de oportunidade completa para fazer crescer a produtividade do trabalho humano.
Em outros termos, vamos continuar crescendo pouco, e descendo ainda mais na agregação de valor no capital humano, com custos de transação aumentando (em virtude do desmantelamento atual, e futuro, das instituições públicas) e perda de competitividade relativa e absoluta do Brasil no contexto do Mercosul, da região e do mundo, ou seja, vamos decair como decaíram a China, desde o século XIX, como a Inglaterra nos primeiros 80 anos do século XX, e a Argentina desde os anos 1930 (e continuando até hoje); vamos ficar atrás dos asiáticos e outros países.
Minha analise é, obviamente mais sociológica (e, portanto, mais impressionista), do que seria um exame econômico, portanto mais fiável e colado na realidade, mas esta é a minha visão do processo que assisto hoje no Brasil, vendo comparativamente o que ocorreu com outras sociedades, em outras épocas. Estamos entrando (já entramos há muito tempo) numa Republica Sindical ainda mais medíocre do que o padrão argentino (que tinha alguma ideologia atrás de si, enquanto o nosso se baseia unicamente na ignorância de 70% do eleitorado), e que promete ficar conosco durante toda a duração do bônus demográfico.
Ou seja, sou pessimista, apenas moderadamente na vertente econômica, mas absolutamente na vertente educacional. Creio que estamos perdendo uma imensa oportunidade de “ficar ricos” – relativamente, claro – enquanto podemos contar com esse bônus; depois disso será muito tarde.
E por que perderemos? Porque a produtividade da mão-de-obra no Brasil é baixa e continuará baixa pelo futuro previsível, com a educação de qualidade medíocre que temos hoje e que continuaremos a ter nos anos à frente.
Em outros termos, perdemos e perderemos, de forma agravada, pois imagino que a carga fiscal continuará aumentando em virtude da inevitabilidade dos aumentos já encomendados dos gastos públicos, com previdência, salario mínimo, funcionalismo, transferências a gregos e goianos (ou seja, a capitalistas, banqueiros e recebedores da Bolsa-Família), além de todos os problemas decorrentes do aumento, ainda que menor, da dívida pública e portanto da drenagem da poupança privada (voluntária) pelos mecanismos compulsórios de requisição estatal, ademais da compressão contínua dos investimentos públicos pelos gastos constantemente altos com juros.
Como se vê, eu sou bastante pessimista quando a má qualidade e à falta de visão de nossos dirigentes atuais (de qualquer vertente, pois a oposição também é inconsequente). Acredito, aliás, que o melhor que poderia ocorrer ao Brasil, quanto antes melhor, seria uma crise fiscal, ou uma crise de transações correntes, pois uma delas, ou as duas, pelo menos nos obrigaria a fazer alguns ajustes. De outro modo, só uma “fronda aristocrática” – ou seja, uma revolta dos empresários contra a extorsão tributária – poderia iniciar um processo necessário de reformas, o que acredito, contudo, que não ocorrerá, pois os nossos capitalistas, organizados por sindicatos de aproveitadores, como sabemos, estão muito empenhados em arrancar favores fiscais, proteção tarifária e crédito subsidiado do ogro estatal que os explora do outro lado, e a todos nós.
Acho que vamos decair lentamente, um pouco como a Inglaterra nos primeiros 80 anos do século 20...

Brasília, 29/08/2011



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